A verdadeira vida é espiritual, visto que todos são espíritos, embora encarnados, enquanto que a matéria é ilusória, passageira, de duração relativamente efêmera e de valor secundário. — Luiz de Souza

Os Deveres - Por Luiz de Souza

Os espíritos encarnados aqui se encontram investidos de deveres intransferíveis; cada qual tem o seu, com o fim de servir-lhe de depuração para a alma. Na maioria das vezes não são os deveres agradáveis de cumprir, podem ser sumamente pesados, difíceis, estafantes, que exijam uma dose forte de sacrifício, de renúncia e de resignação.

Compenetre-se, porém, a criatura de que eles não foram traçados para agradar, mas para amoldar o ser a determinadas injunções da vida, para lapidar o caráter, para desenvolver o senso da responsabilidade, para ensinar a dirigir, a lidar com o próximo de temperamento desigual, para fazer trabalhar o raciocínio, para aceitar a vida com ela é, e para cada um saber tirar do dever imposto a lição que ele encerra.

Pode se considerar a humanidade dividida, economicamente, em três classes, a pobre, a média ou remediada, e a rica.

Na classe pobre, impera, quase sempre, o trabalho manual ou braçal, mais ou menos rude, que exige energia física, renúncia de conforto e severo controle da economia privada. Os deveres que se impõem a esta classe, perfeitamente definidos, como nas demais, asseguram a especialização dos ofícios, na sua grande variedade, habilitam os seres a praticar o socorro mútuo, pela ação direta, tornando se responsáveis pelo suprimento das utilidades, inclusive os produtos alimentícios, ao consumo comum, e entre os consumidores se incluem todas as classes: pobre, média e rica.

A classe pobre suporta, em regra geral, o rigor da carência, às vezes com estoicismo, outras com exemplos de resignação. Poucos são os infelizes que se revoltam com a natureza humilde dos deveres, e procuram, em vão, sacudir o jugo das limitações a que estão sujeitos.

Evidentemente é uma classe indispensável à vida, tanto quanto as outras, e por essa indispensabilidade, forçoso se toma que os seus representantes tenham paciência nos seus postos, pois se neles bem cumprirem os seus deveres, na volta à Terra terão oportunidades muito melhores.

O fato importante a registrar são as proveitosas lições recebidas nessa classe. Assim, os que nela trabalham, estão empregando muito bem o seu tempo e preparando se para novos empreendimentos futuros. Nem todos os seus componentes são pessoas que se estão iniciando na vida espiritual; muitos são espíritos que já fizeram as suas incursões pelas outras classes, mas que tiveram de voltar a ela pelo mau uso feito do livre arbítrio. Para estes, a adaptação ao meio já é mais penosa.

Com respeito à classe média, vale dizer que os seus integrantes sustentam também as suas fases delicadas. Precisam, muitas vezes, participar da vida em meio abastado, com a obrigação de exercer misteres próprios da gente pobre. Os recursos são quase sempre escassos, em face do preço das aparências. As donas de casa são as mais sacrificadas em seu meio, pois os afazeres domésticos, na realidade, as obrigam, por serem almas mais polidas do que as da classe anterior, a uma abnegação excepcional, para aguentarem a rudeza do labor.

Dispondo, comumente, de corpos físicos mais delicados, comparativamente, têm de suportar uma carga de serviço que pode parecer superior às forças em reserva. Neste ambiente dão se muitos desastres morais, pela falta de compreensão e espiritualidade. Vencem aquelas criaturas que trouxeram valioso acervo de lutas anteriores e possuem a alma curtida pelas experiências passadas, muitas vezes repetidas.

A vida nesta classe oferece perigos maiores do que na primeira enunciada, por ser onde se marca passo, até por centenas de encarnações. Aí se encontra o maior número de pessoas revoltadas, inconformadas e desajustadas. As folganças na vida da classe rica são objeto de aspiração dessa classe que, não estando espiritualmente preparada para compreender a realidade dos fatos, exaspera-se, comete desatinos e perturba se. No entanto, muitos há que compreendem a situação pelo aspecto da vida espiritual, e seguem os seus caminhos, serenamente, na certeza de darem por bem aproveitado o tempo aplicado nos deveres que lhes tocam.

Na classe dos ricos se encontram aqueles que, em maior proporção, estão acumulando débitos. Andam pelo terreno das futilidades. Pagam a servidores para não trabalhar. O dinheiro cobre todas as necessidades. Os deveres ficam para os outros. O ambiente de luxúria é o que predomina. Gastos supérfluos são feitos a todo momento. O desperdício é hábito rotineiro. A desgraça alheia fica muito distante. Exercitam a falsa caridade e os atos chamados piedosos se misturam com as pompas sociais.

A vaidade, o orgulho, a presunção, a ostentação de grandezas, a arrogância, o enfatuamento, são, ordinariamente, os alimentos viciosos do espírito. A maioria deles, na volta à Terra, irá para a classe dos pobres. O dinheiro é o veículo mais apropriado para o indivíduo pôr à mostra uma série de defeitos morais; com dinheiro farto, ele dificilmente se contém; dá expansão franca e plena aos seus instintos, às suas ânsias insatisfeitas, à sua grande e falsa oportunidade. Então farta se de semear o joio, sem se preocupar com a colheita.

Nem todos, porém, se perderam nesse caminho ilusório, visto que pela sensibilidade espiritualista, têm consciência da Vida e procedem como criaturas seguras da sua posição.

Muitos outros penetram nessa classe provindos das outras duas por processos ilegítimos baseados na usurpação, no assalto, na especulação desonesta. Estes são autênticas vítimas de si mesmos, cabendo lhes devolver em dobro tudo quanto subtraíram dolosamente do seu semelhante.

Os cavilosos, os ludibriadores, os mistificadores são dos que muito perdem nesta vida e serão, por largo tempo, perseguidos pelo reflexo das suas más ações. Terão de suportar o retomo impiedoso de suas tramas criminosas. A lei da causa e efeito não falha e não tem sensibilidade, por ser simplesmente lei.

Na classe dos ricos estão os poderosos, os que exorbitam da sua autoridade e posição, os que mandam com o dinheiro na mão. Querem ver a sua vontade satisfeita, e não falta quem se sirva a prestar os seus serviços, por interesse, a elementos voluntariosos, déspotas e desalmados. É, por isso, uma classe muito carregada de débitos, que começarão a ser cobrados, sem tardança, quando não antes, da encarnação seguinte em diante.

Não há quem nasça sem deveres a cumprir. Todos os têm, e ai de quem se descurar deles! Na classe pobre, enquanto o chefe da família busca, no trabalho, a manutenção dos seus, a esposa e companheira lava e passa, cozinha e arruma, costura e limpa, mantendo o lar em ordem, sadio e alegre.

Na classe média, a dona da casa, embora mais aliviada dos serviços pesados, tem as mesmas obrigações e deveres, mais se esmerando na educação dos filhos. Na classe rica, tem a dona da casa a liderança de todos os serviços, controlando e dirigindo os afazeres dos serventes, mantendo bem conservados os pertences, zelando pela economia dos gastos, pela boa aplicação dos recursos, pela alimentação adequada e sobretudo pela mais completa educação e instrução dos filhos.

Essa tarefa das mães ricas é de grande responsabilidade, pois não lhes faltam os meios, que as das outras classes não têm, para preparar os homens e mulheres de amanhã, para quem passam os cargos ou as posições de maior relevo.

Os espíritos que encarnam com o fim de se elevarem, depois, acima do meio, para realizarem algo de extraordinário, missionariamente, podem nascer na classe que bem entendam, porque por si mesmos se elevarão ao ponto que desejarem.

São almas possuidoras de rico manancial de força de vontade, inteligência e energia, que não terão dificuldade em erguer se à sua própria custa. A maioria, porém precisa do preparo inicial dado pelos pais, especialmente pela mãe, que com eles convive mais de perto, auscultando lhes as tendências e aptidões para cultivá las, ao serviço do bem.

As mulheres e, principalmente, as mães, têm um papel importantíssimo na vida, em nada inferior aos dos homens. Estes devem muito das suas realizações às mulheres, com quem participam da vida, sejam mães, sejam esposas.

Logo, a mulher tem, entre os seus deveres, a missão de consagrar se ao trabalho educativo ministrando aos entes ao seu cuidado, a ilustração precisa, a orientação sadia, a concepção espiritualista da vida, para que se tornem os futuros condutores da coletividade, seres esclarecidos, controlados, empreendedores, honrados, justos, enérgicos e serenos, nobres de alma, capazes, seguros e respeitadores.

Os homens, no cumprimento normal dos seus deveres, devem dar o exemplo de operosidade, de retidão, de esmero, de esforço, de dedicação, de honestidade e de disciplina, num sistema de colaboração e entendimento, para que os resultados sejam sempre os melhores.

Os deveres não devem ser tomados como uma imposição forçada; antes precisam ser compreendidos como um prêmio conferido ao direito de viver. Os que se eximem, por conta própria, de tomar conhecimento dos seus deveres, deixando os por fazer, cometem falta grave, pela qual responderão mais cedo ou mais tarde.

Os animais inferiores cumprem, instintivamente, os seus deveres. Os que estudam a vida das abelhas e das formigas, fornecem pormenores abundantes sobre a maneira pela qual, no seu trabalho organizado e eficiente, cumprem os seus deveres. Os cães, segundo as raças, cumprem, de várias maneiras, as suas obrigações, seja o São Bernardo, salvando vidas, seja o Policial, dando caça aos criminosos, o Pastor ou o Guarda, todos cumprem as suas tarefas. Ora se, de maneira rudimentar, o dever já se esboça nessa classe animal, mais nítido, desenvolvido, bem especificado, há de apresentar se o senso do dever no homem!

Numa fábrica, numa usina, num escritório, numa empresa, numa companhia, que prejuízo pode causar o displicente que descumpre os seus deveres! Em nenhuma atividade é tolerado o indivíduo irresponsável.

Assim como um complicado mecanismo deixa de funcionar ou funciona mal se uma das suas peças estiver desajustada ou imperfeita, também na vida de relação, embora nem sempre se perceba, há um desequilíbrio, uma falha, quando um elemento humano deixa de participar, eficientemente, do funcionamento normal da vida.

É preciso não esquecer que tudo quanto se faz ou se deixa de fazer na ordenação dos deveres, fica perenemente gravado no quadro fluídico das obras de cada espírito.

A ignorância é fonte de erros, de desgraças, de sofrimentos e de infelicidade. Espancar as trevas da ignorância, é o que procura fazer o Racionalismo Cristão, com os seus ensinamentos; desejam os que nele militam que todos conheçam a Verdade sobre a vida, para eliminarem de seus procedimentos erros lamentáveis, que os levem a criar penalizantes situações futuras.

Por esta razão, atente se para a obrigação de fazer cada um a tarefa que lhe compete, sem recusa, sem fugir dela, sem se lastimar, porque tudo muda de uma existência para outra, e essa mudança será para melhor, se os deveres não forem descuidados.

Aqueles que estiverem suportando uma cruz pesada, não esmoreçam, prossigam firmes na jornada, confiando em dias melhores que virão, na certa. Tudo depende da própria pessoa, de não desanimar, não se revoltar, não se lamuriar, pois sabendo que fez jus ao que está recebendo, não se lembrará de recriminar ninguém, antes se conformará e procurará cuidar de preparar um futuro menos atribulado.

Espíritos que hoje são felicíssimos, encarnados ou desencarnados, deixaram para trás vidas angustiadas, momentos amargurados, existências repassadas das maiores torturas morais. No entanto, palmilhando pelo caminho da evolução, os horizontes se dilataram, os conhecimentos assomaram, e a felicidade tornou se presente, a todo o instante.

Uma vez sabendo isso, quem não terá coragem de prosseguir, enfrentando os obstáculos? Se alguém vai com sede pelo caminho e sabe que mais adiante encontrará água cristalina para se dessedentar, não se senta à espera de que a água venha ao seu encontro, mais vai ao encontro dela, reanimado, até alcançá la.

Assim também na vida espiritual todas as almas têm sede de saber, de conhecer a Verdade, de encontrar a felicidade, e ao invés de interromper a marcha à espera de que caiam do céu os objetos dos seus anseios, seguem a sua jornada, valorosamente, na certeza de que indo pela senda da honra e do dever, sob a tocha da espiritualidade, hão de encontrar o que aspiram, e regozijar se da sua conquista.

O objetivo da vida não é estar a criatura a passar pelas mais duras provas da dor. A Vida tem um fim superior e edificante, ao qual todos devem procurar atingir o mais depressa possível. E depressa, quer dizer não fazer em dez mil anos, por hipótese, o que poderá fazer apenas em mil. Trata se de economizar nove mil anos de vidas torturadas.

O caminho está assegurado para aqueles que desejarem seguí lo. Depende de cada um querer livrar se de mentalidade entorpecida pelas seduções mundanas. A verdadeira vida é espiritual, visto que todos são espíritos, embora encarnados, enquanto que a matéria é ilusória, passageira, de duração relativamente efêmera e de valor secundário. Saiba se diferençar a vida espiritual da material, e tenha se por certo que o fiel cumprimento dos deveres terrenos repercute no desenvolvimento espiritual.

O ser, na sua formação espiritual, está fadado a usufruir de todas as satisfações e alegrias da vida, num estado vibratório de tal modo superiorizado, que nenhuma vibração inferior, como a de tristeza, de amargura, de sofrimento, de angústia, de preocupação, de dúvida e de desespero o pode atingir, por falta absoluta de sincronização.

Esse é o estado que todos precisam alcançar, e só assim se pode compreender a vida no seu aspecto eterno. Os seres, no mundo Terra, estão sendo polidos, limados, brunidos, amoldados, plasmados, para tomarem a forma perfeita que lhes compete e a que têm direito. Essas operações doem, sentindo se o indivíduo, figurativamente, ralado, moído, cinzelado, comprimido, para que o fim possa ser consumado.

O que importa é que não sejam criadas dificuldades a essas; operações, furtando se a criatura a submeter se a elas; evitem nas, no entanto, de maneira simples, fazendo bom uso do livre arbítrio, dando ouvidos à voz da consciência ao cumprir os seus deveres, ao desejar encontrar a Verdade, com sinceridade, sem prevenções descabidas, sem pirronismo doentio, sem querer sustentar falsas posições e falsos pontos de vista, só para alimentar vaidade, defender interesses subalternos, entregar se a crendices rendosas e saturar-se de enganosas visões mundanas, refletidas pela inalação do ópio embriagante dessas absorventes e atraentes seduções.

Na classificação dos deveres que tocam a cada um, já estão incluídas as escalas de ascensão aos postos administrativos que devem ser ocupados com a razão clarividente de quem faz um trabalho, conscientemente, não para exaltar se com ele, mas para dignificá lo e enaltecê lo. Em qualquer posto, o indivíduo precisa conservar a simplicidade, a singeleza, a expressão solidária e fraternal, visto que a confiança do Astral Superior só recai naqueles que souberem manifestar a compreensão espiritualista nos seus atos e pensamentos.

A ascensão aos postos chaves de direção de determinados indivíduos, astralmente preparados para isso, nem sempre se confirma, em face de interposições, diante da interferência do livre arbítrio e pela quebra na uniformidade do cumprimento dos deveres. Esses perdem a confiança e o apoio do Astral Superior por efeito de compromissos traídos, por fraqueza moral ou por se deixarem arrastar pelas forças inferiores.

Aqueles que trazem a incumbência de missões mais destacadas, estudaram nas em seus mundos, antes de encarnar, para contornar os riscos a que se iriam expor na Terra, de modo que os que vêm errando não foram apanhados de surpresa no torvelinho da vida, mas deixaram se vencer pelas tentações, afogando se, conscientemente, no mar das seduções.

Não fosse essa queda dos homens, acontecimento tão comum, com evidente mutilação dos deveres, o mundo seria outro e a geração presente poderia prevalecer se dos recursos espirituais para lograr uma vida de bem aventurança, de equilíbrio, de confraternização e de felicidade.

Os Deveres
Por Luiz de Souza

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